Numa colorida orgia de puro divertimento, Amarcord luta para deixar o espectador fora daquele constrangimento causado por uma agoniante azia que chateia. Dançarinos e poetas, pudicos puritanos e cínicos revoltados, encontra-se uma mescla desmesurada de personagens em Amarcord. Feio, gordos, magros, bonitos, todos presentes numa clássica e formidável ideia do pitoresco reconfortante.

Entrega-se a uma explosão de loucura volúvel, de entretenimento saudável e de um orgânico descaramento que insinua um cinema múltiplo e complexo. Livre de escolher o caminho que segue, Amarcord conduz o espectador numa viagem sensacional por uma população que do meio nada se exalta e respira comédia. O irrisório inesquecível irá tornar cada momento imprevisível pronto a susceptibilizar o riso descomunal, a sensação natural de alegria e contentamento.

Uma realização assente num absurdo coerente, em espontaneidades acrescidas, em voluptuosos e aprazíveis corpos femininos, em cheirosos momentos dramáticos, em exagerados rejuvenescimentos pictóricos. Uma teia tão difusa e ao mesmo tempo tão compacta, que irá sublimar cada personagem com direito ao seu tempo de antena. Um virtuoso gesto cinematográfico, singelo e brilhantemente bem-disposto. Uma vitória de Fellini nesta atraente e regozijadora sátira.